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terça-feira, 23 de junho de 2009

Polícia Militar e Ministério Público visitam Dandara


Nesta segunda-feira, 22, o Ministério Público e comandantes da Polícia Militar estiveram na Dandara. Os promotores de justiça, Gilmar e Luciano, faziam-se acompanhar do assessor Fernando Tadeu e do técnico em meio ambiente, Toninho. A PM se fez presente nas pessoas dos coronéis Tiatini e Queiroz, além do corronel que vai comandar o Batalhão a ser criado na região. Também de comandantes da Polícia Florestal e outros comandantes das companhias militares da região.

Também estavam presentes os advogados do SAJ da PUC Minas, Fábio Santos e Cristiano de Melo Bastos. O Pe Julio Amaral, vigário episcopal da Região Nossa Senhora da Esperança e membro do Escritório de Integração do Departamento de Arquitetura da PUC-MG, Tiago Castelo Branco.

Tiago apresentou a todos o projeto urbanístico para o assentamento das mil famílias que se encontram na Dandara. Respondeu a todos os questionamento a ele apresentados pela PM. Mas o que se sentiu é que a PM não estava interessada em esclarecimentos.

Na oportunidade se denunciou a discriminação da PM para com a Dandara. Da comunidade use exige extremo rigor em termos ambientais. Contudo, faz vistas grossas com o esgoto que sai da Escola Estadual que existe dentro do terreno e corre para a nascente do córrego. Ou seja, há dois pesos e duas medidas.Também se denunciou o abuso de autoridade que a PM está cometendo, ao impedir que se ingresse no local material de construção, em que pese a liminar concedida pelo Tribunal de Justiça.

Em seguida Tiago, o promotor Luciano e o técnico Toninho percorreram toda a área, para colher dados, tendo em vista a confecção de um laudo. A degradação ambiental na área da Construtora Modelo é monstruosa. O projeto apresentado pela PUC Minas tem um forte viés de recuperação ambiental, tal a sua concepção centrada no viés ecológico, preservando as nascentes, cursos dágua, inserindo áreas verdes, de esportes e lazer.

Ainda esta semana o Ministério Público e a PM vão se encontrar com o juiz que preside o feito da ação de reintegração de posse proposta pela Construtora Modelo. Será mais uma tentativa de se esclarecer os limites a serem postos à ação da PM.

Caso não haja mudança de atitude, a comunidade deverá inciar a construção de moradias, independentemente de autorização policial. O entendimento da assessoria jurídica é que a PM não tem competência para autorizar, nem proibir construção naquela área. A posse foi assegurada às famílias e elas dela podem desfrutar livremente.


sábado, 13 de junho de 2009

Comunidade Dandara recorre de decisão do Desembargador Tarcísio Martins

O Serviço de Assistência Judiciária da PUC Minas impetrou Mandado de Segurança em face da decisão do Desembargador Tarcísio José Martins Costa, da 9ª Câmaraa Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que revogou decisão do Desembargador José de Anchieta Mota e Silva e determinou a reintegração de posse da Construtora Modelo em área situada na Região da Pampulha.
Além dos aspectos éticos que foram desconsiderados pelo Desembargador Tarcísio Martins, o Mandado de Segurança aduz:
- Violaçao aos Direitos Humanos, ofendendo a Constituição da República, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Pacto de San José da Costa Rica e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos Sociais e Culturais, todos firmados pelo Brasil.
- Violação às disposições do Código de Processo Civil, pois a Construtora não provou ter a posse do terreno, mas apenas a sua propriedade. Tampouco individualizou o imóvel onde pretende ser reintegrada na posse e muito menos disse da sua localização. Os documentos juntados pela Construtora Modelo dão conta de terreno situado no Bairro Trevo, em Olhos d´´Agua e na Nova Pampulha.
- Violaçao ao princípio da Função Social da Propriedade, pois o terreno se encontrava abandonado há mais de trinta anos. Além do mais, em relação ao mesmo terreno, a Construtora Modelo sequer pagava impostos. São cerca de 2 milhões de reais de dívida de impostos para com o Município de Belo Horizonte.
- A decisão atingirá cerca de 4 mil pessoas, dentre as quais quase mil crianças, sem que se saiba onde vão ser jogadas.

Maiores informações:Prof. Fábio Alves dos Santos, SAJ PUC Minas, 87651680 - 33751680

terça-feira, 19 de maio de 2009

Água, direito humano, direito de todos!

A COPASA CORTOU A ÁGUA DE 1.086 FAMÍLIAS do ACAMPAMENTO DANDARA

Frei Gilvander Moreira

“Tive sede e não me destes de beber... Toda vez que deixaste de dar de beber a um desses pequeninos, foi a mim que o deixaste de dar de beber”, disse Jesus. (Mateus 25,42.45).

Na madrugada do dia 09 de abril de 2009, uma quinta-feira santa, cerca de 130 famílias de sem-casa e sem-terra, organizadas pelas Brigadas Populares, Fórum de Moradia do Barreiro e pelo MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – ocuparam um terreno abandonado (cerca de 40 hectares – 400.000 metros quadrados) há mais de trinta anos no bairro Céu Azul, na Nova Pampulha, em Belo Horizonte.
Após cortarem a cerca de arame, dentro de poucos dias já tinham buscado guarida no acampamento 1.086 famílias empobrecidas. Há centenas na fila de espera. Logo pediram, via ofício, à COPASA – Companhia de água e Saneamento de Minas Gerais – que ligassem água no acampamento. Como a COPASA não aceitou ligar a água, os ocupantes fizeram um gato com apenas cinco torneiras para o abastecimento coletivo de todas as 1.086 famílias. Mas eis que no dia 14 de maio de 2009, a Empresa COPASA, com o uso de força policial, efetuou o desligamento da ligação clandestina de água que abastecia o Acampamento Dandara.
Cumpre informar que, no referido acampamento, vivem 1086 famílias que lutam pela conquista de moradia, trabalho e dignidade. São crianças, adultos e idosos privados do bem fundamental da vida, agravando a situação de extrema precariedade das condições sanitárias. O prolongamento dessa situação acarretará a proliferação de doenças infectocontagiosas, casos de desidratação e a piora substancial das condições de higiene. Trata-se, assim, de um caso de saúde pública.
Acrescente-se que essa atitude da Empresa COPASA não se coaduna com os princípios da Constituição da República de 1988, nem dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos e nem com a Lei Orgânica do município de Belo Horizonte. Ora, a natureza da posse em nada interfere na concessão do serviço público, sobretudo quando estamos diante de um bem tão essencial como a água, fonte de vida.
O Comitê de Solidariedade Dom Luciano, da Conferência de Religiosos do Brasil - CRB-BH -, enviou carta aberta ao presidente da COPASA dizendo: “Mais de três mil crianças, idosos e trabalhadores estão em situação de extrema penúria. O problema do desligamento da água no Acampamento Dandara, além de ser jurídico, passa ser eminentemente humanitário. Por isso, rogamos encarecidamente que a COPASA religue urgentemente a água e sugerimos que, em caráter provisório, se instale um chafariz ou se coloque tanques para o abastecimento humano. Não se pode matar de sede uma coletividade!”
No princípio era a água; e a água se fez “carne”: criaturas todas do universo. Não somos apenas filhos e filhas da água. Somos mais. Somos água que sente, que canta, que pensa, que ama, que deseja, que cria ... O povo da Bíblia, fruto do encontro ecumênico de inúmeros povos e classes de oprimidos, nasceu de “tribos” que viviam em uma região semi-árida, ou mesmo no deserto. No Oriente Médio, o viver está mais ligado às fontes de água, que são raras, do que apenas à terra no sentido de território.
A água está relacionada com os principais eventos fundantes do povo da Bíblia: na criação, no dilúvio, na saída do Egito, na entrada da terra prometida, etc. Qualquer projeto bíblico só se sustenta perto de fontes de água, de rios ou cisternas. Na Bíblia há uma associação da água com a Palavra de Deus. Ao povo Deus deu água de beber de um rochedo, e durante 40 anos, lhe garantiu o pão de cada dia e a água para beber.
Segundo o relato bíblico de Gênesis 2,1-10.15 a terra é vocacionada para ser um jardim de Deus e o ser humano, um jardineiro. Para povos de regiões áridas, a primeira obra de Deus foi viabilizar a chuva sobre a terra e irrigar uma região quase desértica. Um dia, a falta da água gerou a seca e a fome em toda a região de Canaã. Os hebreus foram obrigados a migrar para o Egito (Gênesis 47). Lá se multiplicaram e foram oprimidos pelo império dos faraós (Êxodo 1). Os hebreus escravos gritaram a Deus e este veio libertá-los, conduzindo-os da escravidão para a terra da liberdade, passando pelo Mar Vermelho que se abriu em duas partes, deixando-os passarem, em meio às águas, a pé enxuto (Êxodo 14). Fato semelhante aconteceu quando, mais tarde, conduzidos por Josué, os hebreus, já reunidos no mesmo povo israelita, atravessaram o rio Jordão, a pé enxuto, para entrar na posse da terra de Canaã (Josué 3-4).
Devemos nos espelhar na hospitalidade de Abraão que oferece água para que seus hóspedes possam lavar os pés (Gênesis 18,1-5); na solidariedade de Jacó que tira a pedra do poço para que Raquel possa dar de beber a seu rebanho (Gênesis 29,10); na decisão de Moisés de garantir o direito à água para as filhas de Jetro (Êxodo 2,16-17); na generosidade da viúva de Sarepta que, em plena seca, não hesita em dar ao profeta Elias um copo de água e um pedaço de seu último pão (1 Reis 17, 10-11); na coragem de Abdias, intendente do palácio do rei Acab, que, mesmo temendo a ira do sistema monárquico, alimenta os profetas com pão e água (1Rs 18,4); na sabedoria do profeta Eliseu que torna potáveis as águas para uso do povo (2Rs 2, 19-21) e que manifesta sua força curando, no Jordão, a lepra do sírio Naamã e fazendo boiar o machado que tinha caído no rio (2 Reis 5,15; 6,6); na ousadia de Judite que sabe burlar a vigilância dos soldados inimigos que controlavam as fontes de águas querendo derrotar o povo pela sede (Judite 7,13-14; 12,7-9). Ao procedermos assim, na gratidão pela água, tornamo-nos água viva. “Aquele que me segue, de seu íntimo jorrarão rios de água viva” (João 7,38).
Rui Nogueira, no artigo “Só bebe se pagar”, reflete:
“Jesus Cristo se aproxima do poço, fonte da água para a região onde está a samaritana. “Só pode beber se pagar”. Descrito deste modo a cena choca. Há quem fique indignado pois não é este o paradigma, o modelo que existe nas nossas mentes. Choca pela figura do Cristo e porque está em confronto com a idéia subconsciente que todos nós temos de que a água é o bem essencial à vida para todos, universal, não pode ser negada.
A figura de Cristo não está ligada à mentalidade mercenária, prova disto é o chicotear dos vendilhões do templo. Para reforçar, no Brasil, prevalece a tradição de nunca se negar um copo d’água ao que tem sede.
Entretanto, as transnacionais trouxeram um novo e absurdo paradigma. “Só bebe se pagar”. Que triste tristeza se encontrar a água, bem essencial à vida e direito humano fundamental transformada em mercadoria. Sempre que as transnacionais avançam nos sistemas de água e conseguem privatizar, por concessões diretas ou comprando ações, os sistemas estatais ou os que tinham gestão comunitária abandonam a prestação de serviços para colocarem as suas atuações no objetivo de “obter resultados financeiros”. Pode-se enfileirar vários exemplos para retratar o desvirtuamento da prestação de serviços para direção dos lucros abusivos para acionistas desligados da nossa realidade.
A COPASA vendeu ações no exterior e hoje tem 75% delas nas mãos estrangeiras. Por ter estabelecido o objetivo de resultados financeiros (está no seu relatório anual publicado nos jornais) nega água para centenas de pessoas moradoras em bairro pobre de cidade do interior recusando-se a fazer a ligação de água mesmo com os encanamentos já instalados. Exige o pagamento de quatrocentos reais para que a ligação seja feita. Comparando municípios sob domínio da COPASA com os que têm a água administrada pelo próprio município as tarifas são até cinco vezes mais caras, mesmo em residências equivalentes. Por que a nossa população tem que ser sacrificada e/ou passar por dificuldades para pagar as contas abusivas que geram resultados que não revertem para as nossas comunidades, estado e País?
A SUEZ (Transnacional de Águas) concessionária de águas na África do Sul, instalou torneiras públicas nos bairros pobres e colocou, ao lado delas, um mecanismo que libera a água mediante a inserção de um cartão pré-pago. A norma é: só bebe se pagar. No Brasil já existe o absurdo sistema pré-pago no serviço de águas de Tocantins. Exploração com o bem fundamental à vida!
Às transnacionais não interessa se criança fica sem água, mães não podem cozinhar, ou não seja possível ter a mínima higiene sem água. Vale, apenas, o fluxo de dinheiro obtido pelo controle de bem essencial à vida. As transnacionais já foram expulsas de várias cidades do mundo e têm que ser impedidas de atuar no Brasil. Água tem que ter gestão comunitária. As transnacionais como grandes anunciantes e controladoras dos meios de comunicação nos iludem com propagandas bonitas e apoio de maus políticos. Fora Transnacionais. Resistir é preciso.”
O sociólogo Maurício Libânio pondera:
“Se para cortar a água que dessedentava as 1.086 famílias de sem-casa e sem-terra do Acampamento Dandara, a COPASA estiver alegando um protocolo assinado com o Ministério Público, que proíbe a ligação de água em ocupações irregulares, a medida é ilegal. A Sílvia Helena, quando era vereadora em Belo Horizonte, em 2004, ano da Campanha da Fraternidade sobre a água, apresentou emenda à Lei Orgânica do Município, artigo 150, estabelecendo que os serviços de saneamento básico independem da regularidade do parcelamento do solo ou da edificação. A medida tem por finalidade garantir água para todos e já foi aprovada pela Câmara e integra a nossa Lei Orgânica. O poder do município vem do fato de ser o poder concedente dos serviços de saneamento na Capital, carecendo à COPASA e ao Ministério Público competência para firmarem termos unilaterais.”
Enfim, parodiando Dom Oscar Romero devemos dizer: “Funcionários da COPASA, vocês não estão obrigados a cumprir uma ordem de superiores que manda cortar água que mata a sede de pessoas pobres, pois essa ordem é contrária à vontade de Deus que quer vida em abundância para todos. Neste caso, o funcionário tem direito de alegar objeção de consciência e dizer: “isso não faço. Minha consciência não me permite.” E agir como o tratorista que ao ouvir gritos de um oficial de justiça, com liminar de reintegração de posse em mãos, e o mandar demolir um barraco de uma família pobre, desceu do trator e disse com lágrimas nos olhos: “Perderei meu emprego, mas jamais passarei o trator em cima da casa de uma família pobre.”

Frei Gilvander Moreira,
e-mail: gilvander@igrejadocarmo.com.br
www.gilvander.org.br

terça-feira, 12 de maio de 2009

A Bíblia na vida, hoje. A partir do Assentamento Pastorinhas e da Ocupação Dandara

Amigo e amiga, leia aqui o texto de Delze Laureano, Advogada, professora de Direito Agrário na Escola Superior Dom Hélder Câmara, em Belo Horizonte, MG; Mestre em Direito Constitucional pela UFMG; Doutoranda em Direito Internacional Público pela PUC MINAS.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Sem Casa são recebidos por Ministério Público Estadual e denunciam situação de descaso. Prefeitura diz que não negocia com integrantes das ocupações

Nesta terça-feira, cinco famílias representantes do acampamento Dandara, no Céu Azul foram recebidas na coordenadoria de inclusão social do MP de Minas Gerais. Estiveram presentes os procuradores das áreas de saúde e infância, além da representação da procuradoria geral e da inclusão social. A pauta foi a situação das cerca de 1100 famílias que se encontram acampadas no terreno. Foram denunciados diversos ocorridos desde a ocupação, iniciada no dia 09 de abril, como a truculência da Polícia Militar e tentativa de despejo sem mandado judicial, ameaças da Construtora Modelo, que se alega proprietária, além da precariedade geral em que se encontram as famílias.

Segundo Joviano Mayer, da coordenação da Dandara, vários direitos fundamentais estão sendo privados às famílias, como acesso à saúde e educação. “Existem muitas crianças no local e as escolas da região tem se negado a recebê-las. Também o atendimento em saúde básica e preventiva não está ocorrendo, o que nos preocupa em face da chegada do frio,” diz Joviano. Os promotores levantarão dados relativos ao cadastro das famílias acampadas e acionarão os órgãos competentes para explicações e ajustes de conduta.

Hoje a Prefeitura Municipal de Belo Horizonte informou aos deputados das comissões de participação popular e de direitos humanos da Assembléia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) que não irão negociar com os manifestantes. A reunião havia sido requerida oficialmente pelas comissões, após audiência pública na ALMG no dia 28/04. Os deputados Durval Ângelo (PT), dos direitos humanos, e Eros Biondini (PHS), da participação popular, além de Carlim Moura (PCdoB) e André Quintão (PT) visitaram as famílias acampadas e prestaram sua solidariedade.

O terreno tem cerca de 400 mil metros quadrados e estava abandonado há mais de 40 anos, e segundo relatos da comunidade local era utilizado para a prática de estupros, tráfico de drogas e outros crimes. A Construtora Modelo conseguiu no dia 12/04 uma liminar de reintegração de posse, mas o Serviço de Assessoria Jurídica da PUC-MG, que presta atendimento às famílias conseguiu derrubá-la no dia 21/04. O acampamento está sendo coordenado pelo MST e pelas Brigadas Populares, que reivindicam a desapropriação do terreno e assentamento das famílias em um modelo que mescle as reformas agrária e urbana.

Segundo Renata Costa, do MST, existe a proposta de um modelo chamado “rururbano”, que “agrega elementos de moradia e produção de alimentos em pequena escala, com intuito de assegurar a segurança alimentar e complementar a renda familiar”. Ainda segundo Renata, o modelo ainda destinaria cerca de 50 mil metros quadrados para áreas de convívio e lazer, como praças, parques e quadras de esporte, pois os bairros do entorno são carentes em áreas deste tipo. “Isto traria qualidade de vida à população local, além de dar função social a este terreno que hoje só traz insatisfações aos moradores daqui,” conclui.

contatos assessoria: 31 8522-3029/31 9702-6725

As informações referentes á Ocupação Dandara estão sendo atualizadas no blog ocupacaodandara.blogspot.com

segunda-feira, 27 de abril de 2009

solidariedade internacional a Dandara

Paris, 27 de Abril de 2009
Movimento Internacional ATD Quarto Mundo
Fórum Permanente sobre a Extrema Pobreza no Mundo
107, avenue du Général Leclerc
95480 Pierrelaye - França
HR/acr2009FP198

Temos acompanhado com o maior interesse tudo o que nos tem enviado sobre as ocupações Dandara e Camilo Torres. Ficámos contentes com a primeira vitória obtida a 21 de Abril. Agora estamos à espera do resultado da audiência pública de amanhã...
Aquilo que nos mandou sobre a luta de Joaquim Barbosa com os outros membros do STF entusiasmou-nos : grande homem, Joaquim Barbosa, é pena que esteja tão isolado... Tomara que houvesse muitos como ele, cumprindo a sua missão de "sal da terra"...
Parece incrível o que aconteceu em Ouro Preto, com esse "cordão de isolamento" à volta da cidade, e essa coisa das pulseiras azuis... Mas não tão incrível assim, porque está na linha de outros fatos que nos participou, como o desvio de verbas do rei do axé ! E quando vemos o que se passou na Fazenda Espírito Santo, e o que faz "a máfia do carvão", nada mais nos poderá espantar. Realmente ainda há muito que lutar contra as prepotências e a corrupção, e em prol da justiça e dos indefesos... Cada dia, cada hora, cada momento, é tempo de conversão, e como diz Marcelo Barros no texto que o Dr. Fábio nos transmitiu, cada um de nós tem que "fazer de sua vida uma existência consagrada à justiça, ao amor e à solidariedade."
"Se nós todos pudéssemos (como diz o Padre Joseph no livro Les pauvres, rencontre du vrai Dieu) mudar o nosso espírito, o nosso olhar e o nosso coração, para trabalharmos e lutarmos, todos unidos, juntamente com os mais oprimidos e ignorados, a fim de destruir a miséria e construir um mundo novo"...
Obrigada por nos pôr ao par das vossas lutas no Brasil ! Isso dá-nos coragem para os nossos combates, todos juntos construiremos um mundo novo, mesmo que esse mundo nos pareça longínquo e difícil de alcançar.
Enviaremos muito em breve um novo número da "Carta aos Amigos do Mundo", o n° 71, consagrado à "Convenção relativa aos Direitos da Criança".
Em nome de toda a nossa equipa do Fórum Permanente, um grande abraço, muito amigo e muito fraterno,
Huguette Redegeld (vice-presidente) e Ana Côrte-Real

quarta-feira, 1 de abril de 2009

A Bíblia na vida, hoje. A partir do Assentamento Pastorinhas e da Ocupação Dandara

Delze dos Santos Laureano(1)

Para início de conversa

Nada sei da Bíblia além do que aprendi nas interpretações em celebrações eucarísticas na Igreja do Carmo, em Belo Horizonte, ou nas leituras meditativas que faço sozinha, ou em pequenos grupos nos momentos de oração. O que me leva a uma busca incansável da compreensão do sentido dos textos bíblicos é a paixão pela interpretação mesma e a mania de filosofar, talvez a melhor herança que recebi do meu pai, um homem do campo com nome de profeta, Joel. É certo que mesmo sabendo, conforme disse Manoel de Barros, que “compreendo sempre o que faço, depois que já fiz”, acompanha-me o desejo de buscar algo para além da experiência concreta e imediata dos fatos. Cultivo em mim uma sede de transcendência, a certeza da presença de Deus/amor na nossa vida, o que nos torna capazes de sermos mais do que a aparente fragilidade humana. E isso, percebo, se dá exatamente quando as pessoas agem coletivamente de forma organizada a partir de uma fé libertadora. Essa a minha experiência com a leitura da Bíblia.
Como advogada de movimentos sociais por diversas vezes tive a sensação de estar vivendo a experiência já vivida e contada nos textos bíblicos. Esta percepção me ajuda a descobrir novos modos para a conquista de direitos sociais e a esperança de dias melhores para a nossa sociedade com os marginalizados na nossa sociedade e a partir deles.

2) Um dia o sol não se pôs no Município de Brumadinho

A primeira experiência que tive do texto vivo da Bíblia foi no Assentamento Pastorinhas, em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte, MG. A área está hoje destinada ao assentamento de trabalhadoras/res da reforma agrária pelo INCRA. Conhecendo a história daquelas famílias e a sua luta obstinada por um pedaço de terra descobri o sentido de certa passagem do livro de Josué (Capítulo 10,12-14) . Após várias tentativas infrutíferas de conseguir, via burocrática, uma área para o assentamento, mais de 100 famílias de trabalhadores rurais sem-terra resolveram ocupar propriedades rurais abandonadas na região. Todavia, as famílias eram sempre retiradas da terra ocupada, após o pedido de reintegração de posse na justiça. Às vezes, antes mesmo de entrar na área eram impedidas pela polícia que, de alguma forma, tomava conhecimento das suas intenções. Aprendendo com essas experiências, as lideranças descobriram que era preciso manter sigilo absoluto acerca da gleba a ser ocupada, até mesmo de algumas pessoas que estavam acampadas com elas na beira da rodovia. Era também primordial escolher bem o dia da ocupação, de modo a retardar ao máximo a chegada da decisão judicial de reintegração de posse.

E foi dessa forma, “sendo simples como as pombas, mas espertos como as serpentes”, com muita ousadia e organização que os trabalhadores conseguiram enfim ocupar na madrugada de véspera do feriado de Carnaval de 2001 uma fazenda de 158 hectares, há muito abandonada pelo antigo proprietário. A primeira parte do plano já tinha um bom resultado: a polícia não teve conhecimento prévio da ocupação. A segunda parte era dar efetividade à ocupação da terra antes que o proprietário pudesse obter na justiça a liminar de reintegração de posse. Deste modo, na mesma madrugada, as famílias, após acomodarem as crianças nos carros velhos que conseguiram para fazer o trajeto até a ocupação, empenharam-se, todas, no trabalho de aração e de semeadura dos 14 hectares de terra que encontraram apenas com monocultura do capim. Em apenas três dias, trabalhando dia e noite, conseguiram arar e plantar os 14 hectares de terra com verduras e legumes. Foi deste modo que o milagre aconteceu. Após o feriado, quando o juiz da Vara Agrária visitou o local para verificar a situação do imóvel ficou emocionado com o que viu. Verduras e legumes já estavam brotando por todos os lados. A terra já estava cultivada e o imóvel cumprindo a sua função social. A decisão do juiz culminou com a compra da área pelo INCRA.

Tudo ocorreu conforme o livro de Josué, só que desta vez em Brumadinho, no Estado de Minas Gerais. “O sol se deteve e a lua ficou parada, até que o povo se vingou dos seus inimigos.” Vingaram mesmo foram as plantas, semeadas ligeiras por aquelas/es trabalhador/res. Vingar para as plantas não significa matar, fazer o mal, significa viver, sobreviver, superar as forças da morte. Vingar dos seus inimigos para aquelas/es trabalhadoras/res Sem Terra significou fazer da terra o que o antigo proprietário não foi capaz ou não quis fazer. E como prossegue o texto do livro de Josué, “nem antes, nem depois, houve um dia como esse, quando Javé obedeceu a voz de um homem.” Naquele dia, o Deus da vida ouviu foi o clamor das mulheres, as lideranças do Assentamento Pastorinhas, que cansadas de ver faltar o alimento na mesa, mandaram o sol se deter no céu para que a noite (que seria a expulsão daquela terra que não cumpria sua função social) não viesse antes de ser toda a terra plantada. Com a luz do dia, e sendo luz de Deus, as pastorinhas, em mutirão, prepararam a terra e semearam não apenas sementes de verduras, mas sementes de uma vida com mais luz, dignidade. Assim, impediram que a noite da opressão anterior se repetisse. Enquanto milhares buscavam alegria e luz no Carnaval, 22 famílias, na luta, plantaram na terra sementes que tem lhes dado dignidade, alegria e luz para todos.

3) Haverá um novo céu e uma nova terra de Dandara

Dandara, a mulher, ontem foi uma guerreira companheira do líder Zumbi dos Palmares. Como Zumbi preferiu a morte à escravidão. Vivendo livre em uma terra com os seus irmãos ex-escravos não se submeteu aos interesses dos grandes proprietários de terra, que dos negros só queriam a força de trabalho, o suor e o sangue. Desapareceu deste mundo quando desapareceu Palmares, a república negra da Serra da Barriga em Alagoas, nas terras Brasil.
A Dandara de hoje, uma comunidade, é a ocupação de famílias de trabalhadores urbanos e rurais ocorrida neste ano de 2009, na Quinta-feira Santa, no bairro Céu Azul,região da Pampulha, em Belo Horizonte. No primeiro momento, aqueles trabalhadores, cansados de serem enxotados que nem cão vadio, de um lado para outro, só tendo a moradia de favor ou de aluguel em barracos de favelas e áreas de risco, entenderam que somente se organizando seriam capazes de conquistar o direito à moradia e o direito a uma vida digna.

Naquela madrugada, aproximadamente 130 famílias de sem-casa e Sem Terra cortaram a cerca e entraram em um imóvel de 400.000 metros quadrados – 40 hectares -, completamente abandonado há mais de 3 décadas. Uma área de terreno já urbanizada na região metropolitana de Belo Horizonte. Pensavam estar entrando em uma área pública, reconhecidamente devoluta, e que, portanto, nos termos da lei, pertenceria ao Estado de Minas Gerais. Somente após raiar o sol ficaram sabendo que a área é reivindicada pela Construtora Modelo, que quer fazer no local mais um grande empreendimento imobiliário na capital mineira.
Mas o equívoco, em nada atrapalhou o intento daquelas famílias de trabalhadores marginalizados. A disposição de luta e a legitimidade de suas reivindicações mobilizaram diversas forças sociais de apoio e abrigou centenas de novas famílias que, atualmente, já somam mais de mil acampadas e mais 500 famílias em uma lista de espera. Todas essas pessoas descobriram uma unidade de luta que os identifica. E foi a partir desses acontecimentos que percebi a riqueza de outro texto bíblico: o livro do profeta Isaías (Capítulo 65,17-25), que narra a construção de um novo céu e de uma nova terra. O autor deste texto nos apresenta a realização do projeto de Deus: vida em abundância para todos e tudo, um mundo de paz, harmonia e alegria. Quem esteve lá e não sentiu esse projeto de Deus na Ocupação Dandara?

Aquelas famílias com coragem e disposição para a luta e para o trabalho mostraram na prática que é possível criar esse novo céu e essa nova terra. Já na Quinta-feira Santa, dezenas de lideranças das Brigadas Populares, do MST e do Fórum de Moradia do Barreiro “lavaram” os pés de centenas de famílias crucificadas na falta de reformas agrária e urbana. Partilharam o pão do sonho da casa própria conquistada na luta. Beberam o vinho amargo de resistir à truculência da tropa de choque que aterrorizou todos no acampamento, enquanto mundo afora nas igrejas cristãs celebrava-se a missa do lava-pés. Antes da Sexta-feira Santa, na comunidade Dandara, Jesus já havia ressuscitado. Ali brilhava, como no Natal, a estrela que guiou os magos para o encontro com Jesus de Nazaré.

O projeto revolucionário de Jesus não morreu na cruz. Ele está vivo em cada um/a dos que acreditam ser possível viver melhor. E viver melhor é caminhar junto nesta vida, com coragem e determinação, conspirando a construção de “outra terra e de outro céu’. Conforme já anunciou a irmã Rosário: estão todos ali caminhando seguindo bons pastores e boas pastoras.
E realmente, a Ocupação Dandara é o mais novo sinal de que Deus está criando ali pelas mãos e organização dos trabalhadores um novo céu e uma nova terra. Nada está pronto, mas está tudo em construção. “As coisas antigas nunca mais serão lembradas, nunca mais voltarão ao pensamento.” Por isso já estão todos alegres. Não haverá mais choro ou clamor. Lá, no Dandara, correm por todo lado as crianças, que não estão condenadas a morrer precocemente, de fome ou vítimas do tráfico de drogas. Tudo porque naquela terra serão plantados alimentos, serão construídas casas onde não haverá espaço para drogas e violência. A ordem ali é que crianças estudem e brinquem. Criança que brinca e estuda é projeto de cidadania. Famílias que vivem em comunidades são famílias de esperança.

Ali no Dandara, de forma organizada, trabalhadores e pessoas que têm compromisso com a vida, como no livro de Isaias, “construirão casas e nelas habitarão, plantarão vinhas e comerão seus frutos. Ninguém construirá para outro morar, ninguém plantará para outro comer”, como sempre aconteceu no mundo em que viviam: pedreiros sem casa que sempre fazem casas luxuosas para outros morar. Ali, “a vida do povo será longa como as árvores.” Ninguém trabalhará inutilmente, ninguém gerará filhos para morrerem antes do tempo, porque todos serão a descendência dos abençoados de Javé.”

É bom que os lobos e os leões conheçam o que está no texto do profeta Isaías e venham aprender a se alimentar de todas essas belezas com o povo do Dandara, porque está escrito no texto sagrado que “ninguém causará danos ou estragos ali.” Olhem por toda parte naquela ocupação e ajoelhem-se diante do milagre de que são capazes os pobres. Vejam como podem construir com os restos dos ricos. As 1084 barracas são todas de pedaços descartados de construções, madeiras velhas, carpetes usados, plásticos e panos emendados. A partir do lixo de uns estão construindo um novo céu e uma nova terra. São capazes de plantar ao redor das barracas jardins - na terra dura ainda sem adubo -, porque a vida nasce em todos os lugares. São capazes de colocar dons e talentos a serviço de quem precisa. Quem já foi vigilante e prestou serviço militar, com muita alegria e dignidade, ajuda na segurança do acampamento. Quem é carpinteiro, além de construir o seu abrigo ajuda outras famílias a fazer as suas barracas. Unidos fizeram-se fortes para resistir à truculência da tropa de choque para esperar o milagre da suspensão da ordem de reintegração de posse pelo Tribunal de Justiça.

Tudo isso confirma o que temos anunciado há muito tempo: um mundo novo está sendo construído, com a graça de Deus e pelos pobres que irradiam a luz e a força divinas no mundo.
Quem tiver olhos para ver, veja lá e aqui: http://ocupacaodandara.blogspot.com

Belo Horizonte, 12 de maio de 2009.


[1] Advogada, professora de Direito Agrário na Escola Superior Dom Hélder Câmara, em Belo Horizonte, MG; Mestre em Direito Constitucional pela UFMG; Doutoranda em Direito Internacional Público pela PUC MINAS; Integrante da RENAP – Rede Nacional de Advogados Populares; E-mail: delzesantos@hotmail.com

[2] “Foi então que Josué falou a Iahweh, no dia em que Iahweh entregou os Amorreus aos israelitas. Disse Josué na presença de Israel: “Sol, detém-te em Gabaon, e tu, lua, no vale de Aialon!” E o sol se deteve e a lua ficou imóvel até que o povo se vingou dos seus inimigos. Não está isso escrito no livro do Justo? O sol ficou imóvel no meio do céu e atrasou o seu ocaso de quase um dia inteiro. Nunca houve dia semelhante, nem antes, nem depois, quando Iahweh obedeceu à voz de um homem. É que Iahweh combatia por Israel.”

[3] Optaram por plantar verduras e legumes, porque as crianças estavam desnutridas. Precisavam garantir o mais rápido possível alimentos de qualidade para salvar as crianças. Adubaram de forma orgânica, porque Valéria, uma das Pastorinhas, tinha se formado em Técnica Agrícola na Fundação Helena Antipoff, onde agroecologia é uma prioridade absoluta.

[4] Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra; www.mst.org.br